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A bailarina envergonhada
Ou como os alunos estão começando a aplicar o processo formativo.
Regina Favre e Grupo BS2
Aluna: eu não sei o quanto eu aplico de fato tudo que a gente tem vivenciado aqui, mas tem muitas questões que me permeiam… sinto uma construção acontecendo… dou aulas no campo da dança clássica e do dançar clássico onde tem um jeito de fazer, um certo corpo, uma certa postura, passos ou algo a ser feito de um modo preciso… a minha questão é de ir amaciando isso, sair do duro, do endurecido, do já conhecido, para me tornar mais permeável… Experimentar um outro corpo e tentar me questionar… ver como o corpo pulsa dentro da estrutura do balé clássico e como eu possibilito uma outra experiência que não um estereótipo de corpo, de uma coisa já pronta, de uma forma que vem de fora. Como construir isso para mim e para o outro? E no meu dançar também… eu não trabalho com a codificação no meu dançar… é muito fácil apegar-se em técnicas a priori… aí, no fim, fica tudo meio sem sentido, meio sem sentir mesmo… meio esvaziado também… não sei o quanto eu já saí disso.. estou vivendo tudo isso, mas são questões que não sei como fazer, como aplicar…
Regina – Como você pode fazer para começar a sentir o suco da bailarina clássica em você? O que chamamos de suco tem a ver com a liquidez formativa no fundo dos corpos, lembra? Você pode, neste momento, sintonizar com o corpo da bailarina clássica de que você está falando.. Fica um pouco em pé e mostra para mim e para o grupo o corpo da bailarina clássica. Como você monta o corpo da bailarina clássica?
(Aluna fazendo)
Há uma descrição muito precisa: estica, encolhe, amolece… todas as instruções para montar o corpo da bailarina clássica… você vai montar esse corpo enquanto fala as instruções… fazendo e falando… ações e verbos…
Aluna – verticalizar, organizar a coluna, direcionar os ísquios para baixo, topo da cabeça para cima, bascular o quadril, fechar o abdômen, ampliar o espaço entre os ombros, levar o olhar em direção ao horizonte… os pés bem apoiados no chão, a borda externa bem apoiada no chão, manter o arco do pé vivo, musculatura das pernas e do quadril, rotação externa das pernas em ‘en dehors’, manter força de projeção para cima… empurrar o chão e crescer, dedos, braços leves, redondos…
R – Agora, de dentro da posição da bailarina, você vai sintonizar com o suco da bailarina.
(Aluna faz)
R – Isso.. veja quanta expressão começa a surgir nesse corpo..
A – o suco é bem líquido mesmo…
R – de dentro mesmo desse suco, dessa liquidez, sintonize com um pulso, o pulso líquido… que conversa com o firme e longo que é o corpo da bailarina. Você acabou de montar esse firme e longo. Como o líquido conversa com o firme e longo da estrutura da bailarina?
A – a conversa são tremores acontecendo no presente…
R – então você vai experimentar esses tremores, esses calores…
A – tem um sorriso também…
R – do que é esse sorriso? De prazer?
A – tem prazer, mas tem vergonha também…
R – como você pode mostrar para mim a bailarina envergonhada? Como se fosse fazer a coreografia da bailarina envergonhada.
A – ahahahahahahaha (fecha o ombro e ri)
R – exatamente… continue fazendo…
A – a bailarina envergonhada se assusta…
R – os bailarinos da Pina Bausch todos fizeram dança clássica durante 30 anos, todos têm técnica clássica… só depois foram para o teatro dança.
(A põe as mãos no rosto)
R – isso, a bailarina clássica envergonhada… sempre o suco dentro… o suco que vai gerar expressões no corpo clássico.
A faz … ri
R – isso… intensifica a boca envergonhada, o sorriso… ela às vezes sorri de prazer, às vezes sorri amarelo… intensifica essa boca… vai repetindo a boca da bailarina envergonhada…
A faz
R – mais boca, mais boca, mais cara…
A – não dá pra ficar, tá tremendo…
R – como treme? O tremor está atraindo você para cima, como pode começar a descer e experimentar as ondas de tremor para baixo… a descida do tônus tremendo.
A – ahahahahahaha (suspiro)
R – isso… mais vezes esse ahhhhh, mais vezes…
Isso. Isso… intensifica essa expressão do rosto.. é uma expressão sombria.
Vamos dar vida para esses movimentos de ombro, do tronco, ra lá e pra cá… se esgueirando.. vê essa é uma ação de se esgueirar… isso… vê a cena? … por entre os seus fantasmas… de fracasso, de feiúra, de estrago… olha lá… está acontecendo… isso, se esgueirando… isso… apertando as mãos com medo… olha lá… e passando por entre fantasmas… segurando a si mesma e passando por entre fantasmas… isso… passou…
A – (assopra e ri) tem muita emoção… e muita parede dura…
R – uma emoção muito grande que tudo isso passa para mim… se eu estivesse na plateia, eu choraria.
A – (suspira) … está difícil lidar com tanta emoção… tanta emoção…
A e Regina choram
R – então.. essa é a professora real de que falei… que pode se emocionar…
A – e a dança real…
R – mesmo as bailarinas clássicas podem ser reais.
(A chora e senta)
São Paulo, novembro de 2012
Dez diálogos encarnados
Acompanhando as protagonizações de um aluno ao longo de sua educação formativa.
0. Um dispositivo
Nos Seminários de Anatomia Emocional e de Biodiversidade Subjetiva no Laboratório do Processo Formativo, estudamos como os corpos se produzem e no mesmo ato produzem continuamente ambiente. Muitas ações vão compondo as estratégias através das quais mergulhamos nessa experiência direta.
Na sala, vão se sucedendo minhas falas, as conversas entre e com o grupo, a teoria e os exercícios extraídos do próprio acontecimento individual e grupal, a contemplação de vídeo-gravações e de fotos produzidas no e pelo grupo, produção de ovos cartográficos, solos de participantes, intervenções clinicas pontuais, participação de colaboradores … tudo como alças de feedback sobre o acontecimento, resultando numa produção de conhecimento corporificado, dentro do acontecimento, daquilo que é nosso foco constante: a produção dos corpos no tempo.
Ao longo de 4 a 5 semestres sucedem-se os encontros onde o grupo apreende :
1- Um paradigma formativo em que o modelo do vivo se estende do molecular às formas existenciais dos corpos humanos, sempre dentro das mesmas regras de conectividade e agregação, aprofundando a visão e a vivência do corpo enquanto processador ambiental (link: Um Corpo na Multidão) em continuo processo de produção de si e de ambientes, em conexão com outros corpos
2. Uma anatomia (link: Stanley Keleman, Anatomia Emocional, Summus Editorial) capaz de prosseguir formando a partir do vivido. Ou, em outras palavras, como os afetos se materializam continuamente em estruturas somáticas, ao longo de uma vida em particular, segundo a interação das camadas embriogenéticas, numa embriogênese continuada, do principio ao fim daquele soma em particular.
3. A visão do crescimento dos corpos, ao longo de seu destino genético de prosseguir da concepção à velhice, desencadeando formas do crescimento que se apoiam em interações somáticas que possam vir a oferecer os ambientes confiáveis e os tempos formativos necessários para que um organismo subjetivo possa se constituir, desenvolvendo da fusão até a cooperação seus modos de conectar-se aos ambientes.
4. Uma evidência de que esse processo se dá sempre dentro da história social e dos jogos coletivos de poderes, sentidos e de valores (link: Felix Guattari, As Três Ecologias, Centro de Estudos Claudio Ulpiano). A essa altura da aprendizagem encarnada do processo formativo, já é possível reconhecer, estudar e agir sobre os modos com os quais fazemos corpo nos nossos mundos com essas forças sociais e modos vínculares, e como esses modelaram e continuam modelando nossa realidade somática, segundo a lógica e a gramática formativas estudadas ao longo dos três módulos anteriores.
Os ovos , desenhados continuamente no quadro branco em forma de ovo (link: ovos) na sala, contêm os diagramas que vão se produzindo ao longo das ações. Eles organizam a experiência do processo formativo que vai se desdobrando ao longo dos encontros. Eles abrangem o como, o quando, o onde, as condições, os ciclos, os ritmos, os princípios dentro dos quais se produzem os corpos, sua relação com a linguagem, com a história social, com as imagens, com a biologia molecular, com as neurociências.
Os ovos apontam para uma gravidez, uma possibilidade de sempre mais, para o que ainda não existe,sinalizando que esse modo de notação do acontecimento articulado à teoria da produção de corpo é uma força geradora de pensamento, como se fosse a mente do ambiente sendo gerada através do mapeamento do vivido.
À medida que as pessoas vão assimilando esse saber em seus corpos, em sua linguagem e em seus cadernos, vai se revelando, como uma realidade somática, que esses corpos imersos nesse campo corpante (bodying field) de cada grupo em particular, dentro dos ambientes maiores e menores, são bombas pulsáteis (link: Trabalhando por uma biodiversidade subjetiva) que funcionam como processadores ambientais “bebendo e babando ambientes”…
Os grupos, através desse dispositivo, têm a oportunidade de viver em tempo real, o secretando e o modelando corpo, o intervindo em suas formas através de práticas específicas, o maturando, no ato de co-corpar com as condições presentes, criando ligações que vão ganhando em eficácia na produção de si e da cognição.
No final do programa, o design existencial de cada corpo em suas ações e expressões preservadas muscularmente pela memória do seu uso repetido, amplia seus sentidos. Contemplamos, a essa altura do processo grupal , através do acervo de fotos de cada um, os corpos em suas modelagens vinculares e sociais, seus caminhos formativos, sua participação e modos nos diferentes ambientes e a construção de sua trajetória até o presente. Sempre iluminando a questão de como esse corpo e com que forças e combinações musculares sustenta sua forma presente (link: presença). E finalmente, descobrimos, dentro da lógica formativa de cada corpo, como intervir sobre essa configuração, atualizando-a um pouco mais para que dê passagem às forças do presente, alimentando delas sua continuidade.
Nesse ambiente de imagens, imagens são colhidas todo o tempo, em vídeo pelo camera man presente no grupo e em foto pelo próprio grupo que passa a câmera fotográfica de mão em mão… As imagens, sejam elas das gravações ou das fotos, atuais ou da trajetória de cada um, entre outras muitas razões, são importantes por nos permitir ver que os corpos são ação lentificada , solidificada em tecido e estão sempre em ação, modelando ações… alguma ação… sobre si mesmos e sobre o ambiente… uma anatomia de tubos dentro de tubos, camadas, bolsas, diafragmas tal como descreve Stanley Keleman, pulsando, trazendo para si, conduzindo, processando através de uma infinidade de ações, em múltiplos níveis interconectados, moldando-se e expressando-se sobre o ambiente,articulando-se ou afastando-se dos outros corpos, de quase infinitas maneiras, sempre produzindo a si mesmo e aos ambientes de algum modo.
Esse modo de funcionamento em múltiplas camadas do acontecimento no ambiente-seminário resulta em um reconhecimento constante dos modos de funcionamento ali-no-presente e uma relação cada vez menos narcísica, seja negativa ou positiva, com as próprias imagens, o que resulta numa naturalidade que é captada dentro da artificialidade evidente da presença dos elementos de gravação e exibição de imagem (link: Trabalhando por uma Biodiversidade Subjetiva)… Captar imagem, deixar-se captar, assistir-se, reconhecer-se, exercitar gramáticas… Praticar o ato de corpar segundo propõe Stanley Keleman em seu Método do Como (link: Corporificando a Experiência, Stanley Keleman), os diferentes aspectos do design anatômico de comportamentos, ações e expressões, problematizando-o e recolocando-o em trilhas formativas, torna-se uma linguagem cada vez mais corrente nos grupos sob minha regência.
Reger o processo grupal, para mim, Regina, em seu fluxo contínuo de presenças somáticas e ações que as sustentam, é, por excelência, o exercício do contato imediato e encarnado com o acontecimento vivo que me alimenta na criação da linguagem e do conhecimento formativos. O acontecimento vivo, em sua metamorfose permanente, requer uma posturação dos afetos, uma poética e uma oralidade específicas para que se comunique.
Um acervo de vídeo-gravações, transcrições e fotos de um dispositivo de produção e captação bem montado são um tesouro de acontecimentos preservados a que podemos recorrer sempre… como vamos fazer na sequencia.
Acredito que esse seja um grande instrumento de produção de conhecimento e sua transmissão para as pessoas e grupos que pensam e trabalham sobre a realidade encarnada.
https://youtube.com/watch?v=nMpjeyms6fg
1. Um corpo que pensa
Aluno– Estou sofrendo para pensar…
Regina – Tente ficar um pouco mais permeável… o seu design me comunica, que você tem um evidente medo de perder o pensamento se fica menos denso…. experimente ficar um pouco menos denso e veja se você pensa melhor…. deixar o olhar um pouco mais molhado e menos duramente focado. Procurando, procurando, procurando… isso… pisca mais molhado… agora respira um pouco e você vai ver que você vai captar melhor: os corpos encontram modos de comunicar as experiências que emanam do próprio design, tornando o nosso design inteligível ao outro.
Regina – Olha para mim… o que eu estou fazendo?…
Aluno – Muito difícil…
Regina – … Veja… existe uma ação e um modo em curso…eu estou te dando tempo… olha …eu estou parada… interessada… em você… sem te pressionar…. é isso o que eu estou fazendo.
Aluno – Tem uma intensidade muito grande… é difícil segurar e me conectar ao mesmo tempo… não sei como conter…vaza de mim… vivo excitação demais na presença…
Regina – Sim, vaza por um excesso de excitação…concordo… mas também você não tem desenvolvida a confiança de que possa formular as intensidades por aqui,pelo peito… isso criaria mais espaços para conter sua excitação e vivê-la…. é como se você não quisesse habitar a realidade do peito… quisesse ir direto para a cabeça. Vamos tentar abrir mais espaço no peito, criar um campo próprio atrás do osso externo… criar para você um nível um pouco mais relacional… repito, te falta ter uma vivência mais assumida de peito. A intensidade a que você está acostumado é a de barriga que é mais genérica… a de peito é mais relacional, mais dirigida… Tente criar mais espaço no peito para fazer uma captação do ambiente… e deixe a excitação preencher você por trás do osso externo… o pulmão encher, rotar lá dentro, o coração conversar com o pulmão, captar a ação do nervo vago no peito espalhando um clima.
Aluno – A sensação é bem melhor, fica tudo mais esfriado.
Regina – Sinal de que excitação começa a ser distribuída por mais áreas. Comece a captar atrás do osso externo sua sensação de esôfago, de traqueia, do movimento do pulmão que enche, esvazia, rota e veja como você vai ganhando toda uma paisagem de intensidades dentro do peito.
Aluno – Diminuiu a sensação nos olhos…
Regina – Agora você está sentindo… antes queria só enxergar através dos olhos… veja como é diferente essa sensação de peito… compare com a da barriga. Isso… você pode manter a pulsação no peito mantendo ele um pouquinho armado com a musculatura… note que seu peito se desativa com muita facilidade…
Aluno – Aqui fica melhor, mais vivo, meio agressivo… eu tenho um certo medo de entrar em contato com a minha agressividade… mas acho que precisa de agressividade para pegar o ambiente.
2. Pegar o ambiente é um ato agressivo
Regina- Eu tenho uma fantasia: pessoas grandes temem a própria agressividade. Veja como você pode encher mais de si o seu peito e ficar mais poderoso… essa sensação de leão, de rei, de homem grande.
Aluno faz a ação e ri.
Regina – Poder ser um homem grande, bonito, que brilha.
Regina – E manter esse peito… a partir de dentro…
Aluno – É bem difícil… muitas coisas acontecem e a gente começa a criar esse distancimento…
Regina – Você acabou de falar como um corpo se forma… muitas coisas acontecem e os corpos vão se moldando, se adaptando como conseguem… nós temos uma adaptabilidade muscular extraordinária… a gente vai se moldando naquelas condições e ,quando vê, o comportamento está organizado muscularmente e você já não se dá mais conta. Só percebe que está com o seu campo de possibilidades reduzido.
3. Peito: mais manso, menos manso.
Aluno – Vejo no vídeo uma rigidez na parte anterior, uma dificuldade de me fechar, uma pressão muito grande que vem de dentro.
Regina – Faça em você agora o que você está vendo no vídeo … a gente vai fazer um recorte… se alguém quiser, imita como que ele faz para compreender o que acontece nele… imitar a si mesmo é o primeiro passo para aprender sobre si… imite como você está se vendo no vídeo agora. Em seguida, você pode deitar no chão e fazer aquela organização que está vendo em pé na tela. Olhar, imitar, fazer a mesma coisa em pé, deitado, de costas, de bruços. Estamos ativando a relação das três camadas embriogenéticas: excitação, músculos e sistema nervoso. Estamos ativando o processo formativo em você.
Aluno – Parece uma procura… procurando alguma coisa… uma busca de um lugar no espaço… eu estava tentando me localizar… uma rigidez grande… tenho bem a ideia do que se passava no momento.
Regina – Você tem ideia do que se passava naquela hora…
Aluno – Essa dificuldade de se soltar…
Regina – Faz um pouco aquele movimento de barriga, de costas, de encurtamento… no chão… faz e desfaz essas ações… lentamente.
Aluno – Eu estava querendo soltar o corpo… soltar, abaixar e fazer um abdome… para dar sensação de mais flexível.
Regina- Então, vá percebendo a relação das três bolsas (link: Anatomia Emocional, Google Books, Summus Editorial)… cabeça, peito e bacia… como é essa experiência de você tentando coordenar as três bolsas?
Aluno – Parece que tem uma coisa que impede aqui (diafragma)…
Regina – Vá captando esse lugar que impede e veja que experiência é essa desse lugar.
Aluno faz movimentos parecidos com os da imagem na tela…
Aluno – Parece que se dou mais espaço na barriga não incomoda tanto.
Regina – Como você usa as suas costas?
Aluno – Aqui (frente) fica colapsado… se apertar embaixo parece que volta.
Regina – Deita no chão… como um somagrama vivo, deitado( link Corporificando a Experiência, Summus)… dobra os joelhos e coloca os pés no chão… como você compara a barriga com o peito?
Aluno – Nessa posição, a bolsa do abdome relaxa mas na região do diafragma continua com uma pressão grande, o diafragma impede a comunicação da parte de baixo com a do meio. E tem uma pressão muito grande lá atrás… desconforto … aperto …
Regina (para o grupo) – Vocês estão enxergando? Cheguem mais perto para ele poder conversar com vocês. Lembra do que a gente conversou sobre o grande e manso em você? Agora, reconheça a diferença, na sua experiência: firmar a bacia e largar a barriga.
Aluno – Eu não gosto de largar a bacia, parece que fica gostoso demais… daí não chega energia na cabeça… dá vontade de me alienar. Mas quando eu fecho a bacia, muda.
Regina – Fecha as mãos junto.
Aluno – Aí sobe o peito e a garganta abre.
Regina – Veja se você consegue organizar nessa posição uma forma mais afirmativa de si… você modela uma forma aplicando micromovimentos sobre si mesmo, já sabe… vá deixando a forma deslizar pelo tecido conjuntivo, por essa viscosidade dos tecidos… compreende?… entre uma forma afirmativa e uma forma mansa…os pés… o que acontece?… os pés ficam soltos, inúteis, quando você faz a forma mansa… veja como pode começar uma afirmação a partir dos pés… notou como mãos esboçam um fechar?… dê mais um grau de firmeza às mãos, mais um grau de firmeza aos pés. O que acontece com a garganta?
Aluno – Abre a garganta, cresce tudo por dentro.
Regina – Diga essa frase a partir dessa configuração de si que emergiu: “Aqui eu me afirmo”.
Aluno – Aqui eu me afirmo
Regina – É bom?
Aluno – Opa.
Regina – Repete… pisa nos pés e vai para a forma… põe voz… vamos colar linguagem na ação… (link Mar de Palavras)
Aluno – Aqui eu me afirmo… aqui eu me afirmo.
Regina – Tem um movimento de bacia… de recolher a barriga. Faça esse movimento de captar o tecido conjuntivo de outra forma.
Aluno – Eu tenho feito muito isso naturalmente.
Regina – Aqui eu me afirmo, aqui eu me afirmo. Aqui eu amanso. Solta a bacia e fica manso. Um homem que não ameaça. Um homem grande que não ameaça. Faz sentido se perceber grande e suave? Vá se experimentando sair da suavidade, fazer firmeza e voltar…
Aluno – Me sinto melhor, me dá sensação de estar mais no mundo, mas a impressão é que isso é circunstancial, essa coisa de ser manso é circunstancial… é uma forma mais recente.
Regina – Foi recentemente que você amansou? Você já foi mais bravo?
Aluno – Já…
Regina – Por que mudou?
Aluno – Problemas em casa.
Regina – Veja qual foi o acordo que você fez consigo mesmo… você se amansando…capte como você faz… legal as outras pessoas estarem fazendo também para compreender o que está se passando.
Aluno – Essa posição até que é confortável. Não é tão agressiva, é um meio termo…
Regina – Parece mais íntegra…
Aluno – Sim.
Regina – Importante você ver que quando solta a barriga, você esvazia o peito… a presença (link: Presença) perde a integridade.. a integridade da forma. Agora você agora vai buscar a relação bacia e impulso dos pés para crescer mais o seu tamanho… veja como faz a conexão entre a bacia, peito, cabeça, passando pela garganta, pelo diafragma torácico e períneo. É o conceito do homem sanfona em Keleman (link para imagem no google books)… faça um pouco mais e um pouco menos dessa forma que você acaba de organizar agora, para perceber como você regula a sua intensidade… e aprender com o processo somático como fazer para sustentar uma intensidade maior de si. Na época em que você desligou a agressividade, você deve ter ficado com medo do seu descontrole sobre a sua força. Imagino eu, co-corpando com você.
Capte seu organismo neste momento… mais mansidão, menos mansidão…. mais manso, menos manso… como pode compor um olhar?. Você tem um olhar muito expressivo, um olhar integrado na forma. Como você sente que fica seu olhar quando você cria mais afirmação, mais assertividade?
Aluno – Esse modo do olhar modifica bastante a visão… a visão periférica expande, dá a sensação melhor de amplidão… estou enxergando mais.
4. Aprofundando a problematização
Regina: Agora, se você deitar, talvez perceba os pulsos de musculaturas mais profundas. Deita aí e vamos. Quer dizer, se quiser … (risos)… Aqui podemos ver o 4º passo da Prática de Corpar de Keleman acontecendo (link: Corporificando a Experiência). Viemos até agora problematizando o que é o amansamento. O que é (passo 1) e como é ( passo 2)… o amansamento em sua anatomia e sentidos. Depois, repetimos a forma com variações de amplitude ( passo 3): mais passivo, mais agressivo, mais manso, mais assertivo. Agora, vamos esperar um pouco e ver se você consegue captar na musculatura mais profunda pequenos impulsos e emergências ( passo 4). Descansa e deixa operar a profundidade. A profundidade está contraída?
Aluno – Bastante.
Regina – Então você vai contrair mais a profundidade e em seguida você vai diminuindo a contração da profundidade. Diminui outro grau de contração e deixa ( passo 3). Descansa. Estica as pernas. Agora você só vai esperar ( passo 4)…. O que vai acontecendo?Você estimulou o padrão, intensificando ( passo 3). Agora a forma do padrão está respondendo reflexamente, movendo-se o em direção tônica oposta, expandindo. Expansão e contração são as ações básicas de um corpo.
Aluno – É uma briga… está faiscando a coluna por dentro, lá no fundo….
Regina – Exatamente… firma os pés no chão… agora , você vai receber essa excitação subindo pela coluna… perceba como ela sobe pela musculatura profunda…. ela está subindo em direção a base da cabeça.
Aluno – Está confortável assim…
Regina – Veja se pode deixar essa excitação entrar mais dentro do peito… isso … agora sim… use os pés e use a bacia. Isso…
Roberto – Parece que tem alguém sentado no meu peito.
Regina – Quem você está sentado em cima do seu peito?
Aluno – Eu mesmo.
Regina – Quem é esse você? Como é o sentado?Tem algo de acomodado, com medo de mudança, uma acomodação antiga… Imaginei…
Aluno – Estou tendo a sensação de separação entre o lado esquerdo e o direito da coluna… uma diferença nítida de tônus… o lado direito está mais tenso, estou mais apoiado sobre o lado direito do que do esquerdo.
Regina – Talvez você, agora que você está abordando esse quem sentado no peito esteja experimentando um impulso de se virar… estou vendo o esboço da torsão. O que acontece se você fizer o movimento e desviar do excesso de contato comigo? (Regina ajuda a torção )
Aluno – É bom… é como fugir.
Regina – E se você virar só o rosto, mudar a direção do olhar? Uma pequena diferenciação …veja se isso cria mais vivacidade para você.
Aluno – Melhora bastante.
Regina – Não olhar de frente, não colocar o rosto de frente… ou fechar os olhos… ou um pequeno movimento para o lado… veja se isso te descomprime o peito. Veja se assim você cria uma sensação de privacidade para você. Não precisa estar tão exposto.
Aluno – Melhor.
Regina – Isso. Veja agora o que aconteceu com os dois lados, com o tônus dos dois lados.
Aluno – Equilibrou mais. Estou sentindo apoio na lombar, o quadril está mais firme.
Regina – Veja como esse movimento de firmar quadril te dá um centro que é seu. Você pode experimentar trazer essa sensação de privacidade também para o quadril.
Aluno – Aqui dá uma sensação mais de enfrentamento, aqui embaixo. Parece que dá força. Dá força.
Regina – Isso é bom para você ?
Roberto – Ótimo.
Regina – Praticar essa forma… repetir… primeiro com você… depois ver os efeitos que isso tem. Mas praticar. Esse é um ponto do método formativo. Alimentar as conexões córtex- músculos. Mas aqui tem também um outro ponto que a gente pode observar do nosso modo de pensar formativamente: todas as ações dos animais, desde os mais primitivos, são genéricas – virar, contrair, afirmar, levantar, descer, fechar, torcer… mas nós constituímos um Quem que é o agente das ações… um sujeito dos verbos… no presente… com uma historia… isso muda tudo.
5. Os corpos se fazem entender
Aluno – Raiva… eu estava notando raiva durante o exercício de ficar em pé…e eu estava perdendo o equilíbrio…
R – Mostra… perdendo o equilíbrio… perna pesada, dificuldade etc…
(Aluno fica em pé….)
Aluno – Eu me tensiono demais para ficar em pé.
Regina – Como? Qualidade da ação? Padrão da ação?… repita… e enquanto você repete diga “é disso que eu estou falando”. Você vai me dizendo e fazendo… “é disso que eu estou falando”… não tenha pressa… você fez uma descrição: perna pesada, dificuldades, mas…. e a condição existencial?…
Aluno – Essa sensação de raiva… como tinha pressão muito grande no abdomen, puxando para baixo, percebi essa tendência… de poder acontecer uma coisa muito louca… de raiva… porque aqui na barriga a intensidade era muito forte… mas parece que travava essa energia toda nas pernas… a raiva tinha a ver com essa impossibilidade de usar as pernas para me firmar… mas quando consegui descer as costelas, abriu… a garganta também abriu, até a voz mudou, parece que eu enxerguei o mundo diferente… deu mais pique … o pensamento fluiu …
Regina – O pensamento vai e volta para o mundo, as pernas colocam você na cena da vida… você foi capaz, neste momento, de se manejar e des-isolar.
Aluno – Eu capto muito o de fora mas tenho dificuldade de trabalhar isso comigo, me sentir, captar o que se passa comigo… agora está melhor… melhor assim…
Regina – Esse você está melhor… mais no presente… não temos pressa.
Aluno – Dá um calor danado…
Regina – Você está se expressando.
Aluno – O que estava represado está começando a fluir.
Regina – São duas operações diferentes: captar fora (exterocepção) e captar dentro (interocepção). E tem uma terceira operação que é captar a própria forma… isto é, como respondo e sustento tudo isso que estou vivendo… é a propriocepção. Voce é bom de captar fora, de até deixar aumentar a excitação dentro… mas por alguma razão, você não identifica a natureza dessa excitação como uma experiência… o que será que eu estou vivendo? Sei lá, só estou me sentindo esquisito…
Aluno – Vem medo quando começa a expressão… sempre tive muito medo, pela própria educação.
Regina – A educação é a relação do crescimento com os ambientes primários. Pela primeira vez eu te ouço dizer essa frase nitidamente: essa excitação, eu vivo com muito medo.
Aluno – Medo de não controlar… por isso eu retenho demais
Regina – Pela propriocepção você pode captar como se controla fazendo isso… é como recortar uma configuração de si … e isolar uma experiência (faz o gesto de conter) para examiná-la, experimentá-la mais intencionalmente , aprofundá-la… e ir compreendendo como faço para controlar uma excitação diante de um mundo que me dá medo e de uma excitação que me ameaça.
Aluno – Só de pensar em fazer isso já dói, parece que me flexibiliza e o corpo não quer…
Regina – Isso é o que buscamos aqui… a experiência direta…o corpo não quer… você aprendeu durante o crescimento que a excitação não é uma coisa boa, que a gente não deve confiar na excitação ,ela leva a gente fazer coisas que não são boas….
Aluno – Eu era o rebelde mas o rebelde que se isolava… contestava mas ficava ali… empacado. (faz o gesto)
R – Empacado, revoltado, mas com culpa e medo de se expressar. Imagino. Expressar-se, no caso aqui, para você, é o crescer nas pernas, o abrir o peito e o se apresentar …mas não pode…. porque mantem em você, estruturado muscularmente, o medo de se expressar… acompanha uma narrativa de si que diz “vai me dar culpa, vai me deixar desarmado, vou ficar muito angustiado, com a cabeça cheia e não vou ter paz depois… ai, meu deus, fiquei isolado do mundo, perdi o contato, não sou mais aquele, perdi a inclusão, não tenho mais ninguém, o que foi que eu fiz, o inferno dia e noite”… pensando, pensando, pensando, você está se narrando… posso imaginar essa história porque você está me mostrando….os corpos são feitos para serem inteligíveis, os corpos não são um mistério… a natureza toda se entende entre si… a natureza é inteligível para si mesma para poder se articular e funcionar…
Aluno – Ufa…parece que tudo vai ficando mais leve …
Regina – O presente intolerável que se perpetuou até aqui está se diluindo…
Regina – Você acabou de fazer uma performance de si no presente… produzir experiência… Fico muito feliz por você… veja que quando a gente vai utilizando a linguagem formativa (link: Mar de Palavras), a gente descobre que existe uma continuidade entre o dizer-se e o filosofar, entre o corpar e a linguagem, como essas atividades não são separadas e estão ao acesso das pessoas comuns. Você não tem que ser nenhum intelectual alemão para dispor dessa linguagem e ter o direito de falar essa língua… é uma língua feita para o homem comum … a filosofia americana nasceu para o homem comum e é para ser usada… usar para viver… viver é estar em conexão se fazendo ao mesmo tempo… vai ficando muito evidente no praticar-se… É disso que a gente está falando…
6. O continuum maturacional das formas somáticas
Aluno – Falando anatomicamente… se eu me fortalecesse mais com exercicios… atualmente estou mais fino… outro dia, aqui, me percebi mais espesso e menos firme do que já fui. A impressão é que se eu tivesse mais músculos eu seguraria mais isso.
Regina – Essa é uma pergunta? Quantos anos tem agora?
Aluno – 52.
Regina – Agora é momento de começar acontecer a perda muscular gradativa… você está entrando na fase da maturidade do soma, (ovo, infância, adultez alfa, maturidade, velhice). O adolescente é uma forma adulta ainda verde. Desencadeia-se, em seguida, a forma do adulto alfa que vai amadurecendo… no final dessa maturação começa a des- hormonação, a diminuição dos hormônios, que produz essa perda, a redução de camadas musculares e mudança de forma. Keleman, em artigos que não chegaram ao público de seus livros, trata muito do que acontece no adulto maduro, o aumento da sensiblidade com o aumento da porosidade muscular, o consequente aumento da bolsa abdominal e diminuição do grande peito do jovem adulto…camadas musculares mais finas com níveis de profundidade e ressonância incrivelmente maiores… a potência é diferente, não é a potência física de ir luta e conquistar… nem a força de procriação e a todas essas coisas da juventude… mas o soma entra em níveis de mais capacidade de captar,absorver,assimilar, aprofundar… você está entrando nessa fase, está em plena transição. Essa forma é para ser cultivada, trabalhada muscularmente para pode ser sustentada … a natureza já não ajuda mais como antes….
Aluno– E a imaturidade do peito em mim que vimos antes?
Regina – Esse peito que é antigo faz parte do presente insuportável de outra época… é necessário atualizá-lo para poder formar um adulto maduro mais inteiro, mais profundo, suportando melhor as camadas mais finas que começam a se apresentar… isso é da vida, esse corpo está se desencadeando agora… como está visivel agora para nós… os corpos se sucedem um depois do outro …esse peito que estamos abordando não se formou no ambiente de você-bebê… evidentemente… em que momento se formou?
Aluno – Na adolescência.
Regina – Aha…no ponto da chegada dos hormônios… quando começa o crescimento acelerado do corpo… é ai, então, que a gente vai encontrar o presente insuportável onde você formou esse peito denso que não pode esvaziar. A ação de pressurizar a excitação na direção das pernas, do centro para as extremidades( rosto, braços, pernas, genitais), no caminho natural do crescimento para firmar-se e se afirmar. Essa era a ação insuportável em curso. Se você quiser agora experimentar-se, deite-se de bruços… e sinta as pernas, o peito, a bacia…
7. Uma experimentação com a anatomia subjetiva
Regina – Acho que fica melhor se for de bruços. Só para você fazer tipo uma radiografia… Coloque-se como se estivesse preparado para rastejar… no chão… você vai só deitar….e nessa posição, captar-se, sentir seu peso, respirando o ambiente … vai captar a relação desse peito com a bolsa da barriga, a bolsa da cabeça… a relação desse peito com braços e pernas… o modo dessas relações revela a anatomia que te coloca naquilo que o seu padrão te faz viver… ela recorta seu estado interno e a sua captação do mundo, ao mesmo tempo. ..
Aluno deitado
Regina – Afaste um pouco mais os braços para perceber a relação braços-peito e peito-bacia. Veja que tem um pequeno movimento lombar…. me conta a partir da forma em que você está… vivendo, experimentando, compreendendo.
Aluno – Parece que o corpo está mais adaptado ao chão, no começo estava a bacia muito alta, parece que relaxou mais, no começo tinha dor no ombro, estava impossível ficar com o braço direito no chão, dor no deltóide, agora melhorou.
Regina – Veja que você está dando um tempo para se captar.
Aluno – O diafragma está mais permeável.
Regina – O diafragma está mais permeável, a bacia está em conversa com a bolsa do peito… ela não está como antes… recolhida, assustada e ao mesmo tempo raivosa.. você está mais tranquilo, com uma presença mais tranquila, a forma mais pousada no chão.
Aluno – Uma tranqüilidade.
Uma aluna – Como seria uma bacia mais raivosa?
Aluno – Recolhida e carregada.
Regina – Excitada… cheia de energia mas sem uma expressão consentida … você pode mostrar para nós a bacia levantada… como seria o adolescente, com a bacia levantada, perguntando-se que faço com a minha excitação toda?
Aluno: Bacia afastada.
Regina – Quem quiser no grupo, pode deitar e imitar … a imitação é servidora da compreensão… vamos fazer essa bacia… Ele vai repetir para a gente ver… olhem por onde ele retira a bacia do chão, onde ocorre a contração nele… há uma parada na ação de expandir e contrair… a forma não sabe como prosseguir.. e não sabia também… como fazer com a excitação adolescente… um meninão grande que não sabia o que fazer com a excitação… um ambiente familiar culpabilizador, moralista… suponho.. e o menino fica revoltado e não ousa nem sabe como fazer de outro jeito…a culpa não deixa… vejam que tem encurtamento na sacro lombar e um aperto no glúteo… com isso o ilíaco levanta do chão…. isso é a memória da resposta estabilizada estruturalmente… memória é isso… o que continua funcionando no presente… Apertando mais para tornar mais clara a ação, você tem o joelho que empurra o chão e o ilíaco que se retira… essa a anatomia você já sabe como identificar, formular e mostrar depois de tantos encontros formativos do grupo… hoje você está podendo deitar no chão e fazer essa performance de si… a forma já tinha a compreensão do que ela podia fazer e fez… mas para que serve fazer e saber essas coisas?
8.Organizando uma expressão de si no ambiente: presença.
Regina – Aplicamos, aqui, essa linguagem anatômica, pulsátil sem deixarmos de ser pessoal… é uma linguagem encarnada… a gente não deixa de ser a gente mesmo para usar essa linguagem… não é apenas um exercício somático.
Aluno – Essa região que pega muito, o diafragma, nesse período todo, nesses dois meses, melhorou muito … estou conseguindo enrolar melhor o corpo… eu tinha o peito muito rígido para poder abaixar…
Regina – Pensa um pouco no encurtamento, na relação com a intensidade,… você ganhou mais graus de expansão e mais flexibilidade no seu encurtamento… você ganhou mais graus no encher e esvaziar das bolsas. A excitação não fica mais lá parada e blindada por uma musculatura encurtada e estabilizada… antes, aquela excitação toda ou saia como tiro de canhão, deixando você culpado ou ficava guardada, acabando por te deprimir.
Aluno- Notei bastante diferença na descida para as pernas… em assumir presença
Regina– Como encontrar possibilidades de fazer descer a excitação do peito para a pelve e depois para as pernas?
Aluno– Contraindo um pouco os glúteos, os oblíquos e jogando o peso mais para frente… anteriorizando o centro de gravidade… dá sensação de fluir mais.
Regina – Sim… a experiência de fluir… não é só uma experiência mecânica essa de fazer essa passagem pela virilha e escorrer a intensidade pelas pernas…
Aluno– Os pés buscam uma abertura como uma ventosa no chão, fico uma pessoa mais firme. Dá vontade de fazer também com as mãos.
Regina – Faça também com a mãos… aí você organiza uma outra expressão de si no ambiente, mas, percebe que você sabe organizar as pernas mas recua com o queixo e a garganta? Existe uma imobilização da musculatura do alto das costas, do rosto… tem um confronto no olhar e um confronto no conjunto nariz e boca que tem a ver, certamente, com longa história de raiva guardada. Mas, certamente, é um confronto mais mental do que na expressão. Se vier mais para frente, mais para cima dos pés, você vai poder criar não só uma vertical mas também um avanço com o rosto. Você pode usar esse deslocamento que você fez com a bacia…
Aluno– Agora eu percebi a ligação interna entre a boca e o assoalho pélvico.
Regina – Então, você já pode construir um oco interno. Você disse que tem pouca ressonância interna dos acontecimentos…
Aluno– Sim…sinto que meus pés plantaram no chão.
Regina – Agora você pode encontrar o lugar da garganta e do rosto… crie essa ligação com o rosto agora. Isso… vá captando no rosto a musculatura das bochechas e do maxilar – há uma força de apertar… densa… uma braveza muito grande, na boca, nos dentes, nos olhos.
Aluno – Aumentou muito o espaço na boca….
Regina – O osso externo, na frente do peito… tudo isso está alongando… percebe como você está alongando os tecidos neste momento?
Aluno – Tudo vem lá de baixo, parece que tudo aqui em cima relaxou. Parece que o maxilar.. ficou leve, o crânio. Nossa! Parece que eu cresci, ate a cabeça cresceu…
Regina – Você se dá conta da densidade na qual você vive? E como ela está organizada?
Student– Isso me dá uma força muito grande (faz um balanço sobre os pés firmados). Aqui eu realmente posso. Está abrindo cabeça, a calota craniana…
9. AQUI: o sujeito somático
Regina – Aqui eu me responsabilizo pelo que eu faço, aqui é comigo mesmo… vá achando o aqui disso, o aqui … um lugar-você… de onde você pode também produzir voz… com a vibração desse lugar vivo…. o sujeito somático é um aqui (link: Um Corpo na Multidão)… apenas um lugar de passagem da vida… mas isso é muito.
Aluno – Aqui eu me afirmo.
Regina – Aqui eu penso por minha conta… diga…. suas pernas vão descendo em direção ao chão a medida em que você já tem como assumir somaticamente o que diz… aqui eu vou procurar o que eu preciso…
Aluno – Dá a sensação de que não precisa mais de tanta energia para se manter, parece que está tudo mais certo, mais encaixado.
Regina – Com certeza… essa é uma organização possível… você está oscilando entre a forma anterior e essa… (vê a imagem de uma gravação anterior no monitor da tv). Olha a diferença de densidade… olha aquele braço, aquelas costas… a densidade… a densidade que encurta você e não deixava você descer… fazendo você ficar armado no peito…
Aluno – A descida dos ombros me mobiliza emocionalmente.
Regina – Quero que você experimente essa dimensão… não é simples. Os ombros podem descer, na medida em que você vai achando o caminho de des-densificar… esvaziar, alongando e não encurtando mais… não é uma questão apenas de se sentir melhor… é de poder ser mais você mesmo.
10. Delineando uma tarefa formativa : o aumento da potência
Regina – Quer conversar da experiência problemática dos ombros ou quer deixar quieto por enquanto ?
Aluno – Sinto que é muito difícil encaixar os ombros… fiz bastante o exercício do “aqui eu me afirmo” … me dá uma grande sensação de força depois… esse sentimento de “eu posso”. Mas logo em seguida vem uma coisa complicada… e eu travo…
Regina – Sim… como poder? Poder. Muitos elementos estão envolvidos na questão do poder. O verdadeiro poder é tranquilo. Aí está a questão. A tranquilidade tem a ver com, entre outras coisas, achar o lugar dos próprios ombros, o que não é simples… Os ombros são uma estrutura complexa. A cintura escapular como um conjunto é extremamente expressiva. Ombros e braços tem a ver com as trocas, com falar, com mostrar, aproximar, afastar, regular… tudo isso são ações da cintura escapular(clavícula, omoplata, braços, mãos, dedos, articulações), tudo isso em cima da caixa torácica que é um mundo . A vivência de si e da realidade da sua experiência na troca com o ambiente se dá muito no tórax, o que eu estou vivendo, o que eu estou trocando com o mundo. E os braços e ombros me posicionam em relação a isso, modulando as formas da ação e as intensidades. Mas é muito complexa a relação da cintura escapular com a caixa torácica. O poder é feito de uma regulagem finíssima de ações sobre si mesmo … não é simples criar relações com o mundo de acordo com a verdade do que você vive no tórax.
Aluno – Sim.
Regina – Há muitas distinções a serem feita nos ombros: o design das ações diferentes, conjuntos operando diferentes expressões, direções de forças do gradril costal em relação à cintura escapular. Não estamos acostumados a fazer a distinção da camada profunda e da camada externa, como a gente também não vê que há forças diferentes entre a ação do gradil costal e da cintura escapular. Achamos que tudo é a mesma estrutura funcionando junto.
Venha vou mostrar… eu queria que você sentisse seu osso externo… o seu tórax desenvolveu uma grande massa muscular que cobre a caixa torácica… você pode imaginar, e sabe como fisioterapeuta que é, como essa região toda de costelas e cintura escapular é cheia de distinções e combinações possíveis a partir dessa estrutura tão múltipla de ossos, articulações e músculos, grande e pequenos… Essa combinação da cintura escapular e a caixa torácica oferece um potencial enorme de expressão quando a excitação enche a caixa torácica… para você fazer os mais diversos movimentos, finos, grossos, afirmar, desafirmar. Mas para isso tudo, precisa ganhar independência das partes e sub-partes e aprender a combinar …senão você vai viver a sensação de aprisionamento de si no tórax aqui e vai executar ações relacionais em bloco… resultando você não ficar satisfeito com o que faz. Ou solta ou prende, não tem muita opção… e o peito é um lugar cheio de opções. Aqui se fazem as relações com o ambiente, porque justamente a encefalização do homem e a bipedização permitiu que a gente liberasse os braços, para fazer não apenas coleta, mas milhões de outras coisas, relações, instrumentalizações, usos… tudo isso sai pelos braços em ressonância com caixa torácica e cérebro.
É visível como o modo particular de cada um funcionar ou, em outras palavras, o padrão é a própria estrutura constituída por um certo jogo de pressões profundas preservado na forma particular das bolsas, tubos, diafragmas, envolta por um certo tipo de musculatura, por um certo tônus local e geral. A forma, enquanto se mantiver agregada desse modo, mantém um padrão de bombeamento e de funcionamento emocional, de conexão com o mundo e consigo, gerando, sustentando um quem que age assim, que fantasia assim,que se narra assim…O quem é o agente, quem, desse conjunto de ações que mantém um lugar em que a vivência se dá. Ao agirmos sobre essa configuração, atualizando-a um pouco mais, estamos abrindo passagem para as forças do presente, para que possam a nutrir sua continuidade. Isso é o que podemos chamar aumento de potência.
O pensamento, a linguagem, os modos de ver, compreender, agir e ensinar na cena dos Seminários de Biodiversidade Subjetiva (link: Seminários de Biodiversidade Subjetiva) são uma resultante de uma livre assimilação e uso do pensamento formativo de Stanley Keleman bem como de uma ação viva e crítica sobre este, dentro de um campo em que se compreende a vida das pessoas como parte de um processo histórico-mundial abrangente em continua produção.
A produção e a captação do acontecimento-seminário, a experiência de registrar, cartografar e editar o drama que se desenrola, ali, na produção dos corpos, dos ambientes e do conhecimento é uma tarefa que mobiliza a invenção continua de tecnologias, ações e práticas dentro do dispositivo do Laboratório. Conceitos e práticas também tem um devir. Como tudo. Não só a vida particular das pessoas.
Halfway – a clinical study
Several reasons led me to choose this case to present at this meeting. But perhaps the most important of these is the fact that we started together, George and I, 4 years ago, each one in his own parallel, a great effort of singularization: me in my clinic, he in his life.
Two weeks ago, in a kind of celebration, we recalled the story of our meeting one another and even now I wonder how from that tangled knot of pain, panic, despair, it was possible to unravel the thread and gradually weave a progressing story.
In January, 1992, he came to my clinic, referred by an osteopath disbelieving in the possibility of helping him, a strange man, sloppy, sinisterly contrasting with my elegant, newly opened office on the twenty-first floor of a medical building in Perdizes. He is immersed in total lack of control. Between sobs, tears, phlegm and vomiting, I am led to think that he can’t find a way of being in his own body. He feels an incredible pain everywhere, and is under violent compulsion to incessantly seek sex in the streets, cinemas and saunas, and has just taken vow in Candomblé, which imposes 21 days of sexual abstinence.
When I say he sinisterly contrasts with my beautiful office I refer to the sudden anguish I felt, a kind of bad feeling, as if at that time of my life when I had envisioned, to paraphrase Virginia Woolf, “A Room of My Own,” a place just for me, in the safety of my space, alone up above, where I could refresh my views of people, try out other authors, other clinical choreographies, the Excessive itself had crossed my path.
I could have not accepted him, have sent him to someone else, but I believe the intensity of that chaos, thinking retrospectively, presented itself as an oracle, like the third hexagram of the I Ching, “Difficulty in the beginning”: “The times of growing are attacked by difficulties. They are like a birth. But these difficulties arise from the profusion of all that is struggling to take shape. Everything is in motion. Therefore, if one perseveres, there is a prospect of great success. When one’s destiny is to undertake a new beginning, everything is still formless and dark. Therefore, one should wait because any premature move might bring disaster. ”
That moment, from today’s perspective, shows up as a “middle ground” in Keleman’s language, a “deterritorialization” in Guattari’s language, for me and him.
For me, in the sense that I’m starting in ’92, with my reading of Guattari, a process of attempting to grasp the polyphonic dimension of subjectivity, trying to understand its multiple causation and at the same time trying to overcome the classical opposition between subject and society. Right now, I’m trying to temporarily put into parenthesis my psychoanalytical references and try to understand what it means when Guattari says: “Psychoanalysis is not ready to face the contemporary subjective cocktail in its way of reducing social facts to psychological mechanisms. Under these conditions, it seems appropriate to forge a more transversalist conception of subjectivity that allows for responding at the same time to its ties to particular existential territories and their openings to value systems with social and cultural implications.”
And there, studying Keleman at that time fit like a glove, in the sense of providing a vision and a clinical tool box that could address the formative process of the subject in its ethological and ecological dimensions, besides both coinciding in a constructivist view of subjectivity: formative, in Keleman’s words, autopoietic, in Guattari’s.
Little by little, supporting Jorge here and there, in a manner somewhat like a nurse, armed with my sociological spirit, I started collecting fragments – the gay world is convulsed by the explosion of AIDS, its existential territory is adrift.
My eye as an ethologist and Keleman scholar makes its first finding: the animal, Jorge, finds itselfs under the violent action of a response from the brain stem facing the threat of extinction to its existential territory, not exactly because of the virus, but rather because of the media.
His mesomorphic constitutional body, square shaped, like a Portuguese villager, under the violent action of the startle reflex, is grinding its joints and tendons, with its powerful muscles.
The compulsive repetition of sexual rituals, in a hardened “ritornello,” was at that level the only way to stop, from time to time, the dizzying, drifting flows.
Quickly, the therapeutic sessions become established, twice a week, in a ritual of relief and connection. I would lay him down on the floor and help him have convulsive discharges of muscle tonus.
And little by little, I was able to gather and sociologically weave narratives of how as a young man of modest background, graduating from a high school attended by children of the intellectual bourgeoisie left, he has no place of social belonging, and he starts, disoriented, first in search of beautiful men, masculine and proud of their own image, trying to absorb them into his body, and then, for several years, finds his place in the then thriving gay activism.
Slowing down the first layer of panic that would completely take him away from contact with himself, we could find a body layer entirely built of pain. In our recalling it a few days ago, he tells me: “the therapy at that time made me touch myself and see how everything was very painful.” Literally, he and I were touching his physical and psychological pain while his stories were emerging: his family lived in a small town, his parents go to work, the older brother, good-looking, the mother’s favorite, is left in charge of the house and violently beats the smaller brothers, amongst the neighborhood children he seeks protection from the older, better looking boy and is “caught” being “fucked” by him – that scene of the “little faggot” for many years fed both his humiliation as well as his erotic fantasies.
In fact, these early recollections are the disqualified vision of his origins compared with his idealized friends who he lost at the end of high school.
Then, we could discriminate between the experience of pain produced in the intercostal muscles by the stiffening of the rib cage and the experience of pain produced by the shrinking of the pelvic muscles. The chest tells of the impotent rage of the smaller animal when facing stronger animal and the pelvis tells of the shameful social impulses when facing the humiliating environment.
We then began to activate the Keleman accordian by compressing and decompressing this spastic layer. We proceeded by embodying the gestures and attitudes of his powerful brother, and organizing his repressed anger and revengeful feelings from when his brother died violently at a young age.
The next step was revisiting his boyhood.
On a train trip to his hometown, Jorge revisited these childhood years. Avalanches of memories brought back the fear, the lonely games, the smells, animals, colors: he experienced for the first time what Keleman calls “long-body,” the body that has always been there, a flavor of oneself, the feeling of “keeping on being,” as Winnicott says. He seems to have constituted, at that time, a trust in no longer being annihilated.
As this layer becomes more flexible with the experience of fragility, we begin to tune into fundamental aspects of his formation: the father’s absence seen as having no function, the familial world completely filled by the mother as teacher and provider, the compulsive search for masculine bodies, and the strength of the first erotic relation interrupted by getting caught.
And for the first time in many years, he gets involved in a relationship with a very poor guy, nearly a prostitute.
It is very important to mention here how much the writings of and my personal contacts with Nestor Perlongher, an Argentine poet, anthropologist, and gay activist, also known by Jorge, helped him to legitimize this micropolitics. This fueled our discussion of the “becoming-gay,” about the formation of a gay subjectivity in the social fied and about the quality of his personal homoerotic search: his lust for the characteristics of the masculine body, the intimacy of a masturbatory relationship, the pleasure of being penetrated.
Along with the discussion about normality and his melancholic idealization of happy people, we began to explore issues of inferiority and superiority contained in his inflated chest.
Then, we revisited the whole pantheon of masculine figures: the practically illiterate store clerk father, the military uncle, the mayor’s son in his hometown, the handsome young man with whom he had sex for the first time, and in more detail, the two best friends from the left-wing bourgeois families who had such different destinies than he after high school.
At this stage, we drew somagrams of all these masculine bodies, in order to body them up, experience them again, in an almost anthropophagic ritual of these identities.
The absurdly spastic and painful legs do not accompany the plastic process through which his trunk undergoes.
We decided to try a Rolfing process, simultaneously with the therapeutic process, now happening once a week.
At the same time, we wonder, how did this mother, a small-town teacher, have the power to put her son in the best, most modern high school when moving to São Paulo?
And also, why not women?
It is important to say that Jorge, when finishing high school, as his friends were heading for music and cinema, fields that only children of wealthy intellectual families can afford, goes college to study language, which would open the teaching profession, the leading thread of his entire maternal family tradition.
Spastic legs that refused to put down roots in some psychosocial soil slow down. Beneath the external stiffness of his trunk, already worked many times, finally a deep body made of inflated and expanded tissue shows itself.
And with this layer, the mother is shown, and the history of interactions with the maternal world.
In the context of this relationship, even more than the theoretical understanding of the bonds of dependency, my fondness for film was of the utmost value. There I learned to recognize the family sagas and institutional lines that act as vectors for desire-as-future-producer.
Who is this powerful mother who gives everything and demands everything?
One of the São Paulo countryside’s middle class’s greatest organizers was the tradition of teachers.
Precursor to the feminists, girls left home to study in Sao Paulo, at the Teaching School Caetano de Campos, and then, starting their professional lives in small towns in the countryside.
The image of the working mother, severe, identified with the excellent ethics from São Paulo’s classical teachers, the one who provides the home, a mother and teacher of her children, the one whose life is always a struggle, emerges in our sessions with all its force, as we access this inner layer.
The mother who appears here is the mother who wants everything for her son and angrily punishes him at school, stepping on his education; which later puts him in a school beyond her means, even beyond their social class; which provides him with money for adventures in Europe as young Brazilians do in the ‘7Os.
Where did this woman get her money, God knows. Probably a combination of public employee insurance with the dignity of the teaching profession, first of all, certainly sustained her in her determination.
We can say that as teachers become poorer in the Brazilian social process the more this mother feeds her children to get some place.
We say that an effort to be somebody dominates Jorge’s existential realm – being a man in the world of men, bringing forward the family, the lower middle class, the teachers world, rescuing their dignity, maintaing its old beauty in the current socio-political landscape.
It must be said that Jorge is a teacher in a public neighborhood school: he started a graduate school course, he has a contract with the public school system, is dedicated to working with lower class children, becoming involved with their difficulties.
However, this inflated layer tells us that the mother, the excessive provider, raised a child unable to sustain frustration, with a lot of difficulty organizing himself when facing situations that require time, rhythm, one step at a time.
It is revealed, at this point, the person who is extremely messy, gluttonous, excessive, who acts on impulse, loses his own things, including money, who panics at the idea of sustaining an effort like a master’s thesis, who exposes himself to dangerous situations such as getting involved with sex in the street, who is deathly afraid of being without a another body to relate with, does not take the time to be selective.
Together with these findings, the inflated body begins to be tamed, also organizing degrees of pulsation.
At this stage of his process, cries of helplessness and fear of growing predominate.
Coincidentally, at this phase in therapy, the mother became severely ill, and Jorge has the opportunity to organize a few things:
– A donor body for the ailing mother;
– A body of closeness for his father.
For the first time when he dreams of his elderly parents having sex, like in the movie “Chuvas de Verão,” he can see a great love between them and tells me how they met in a country town where his mother was a teacher: his father rough, gallant, romantic, a salesman, son of farmers, almost illiterate, wins the heart and the lust of our proto-feminist, dedicating his life to follow this determined and enchanting woman.
With the episode of illness, the family, previously dependent on the centralizing strength of the mother, is organized in a much more cooperative way.
We could ask ourselves at this time, through which conjunction of flows, the younger brother and sister who directed themselves to heterosexual choices and got married.
The legs, now less spastic, begin to ground themselves in their existential reality, his chest moving with amorous feelings, the inner layer retracting so that the Other begins to exist for him.
In the interface of the inflated layer with the rigid one, we discover a curiously dense body that belittles and attaches.
At that time, he has a dream in which he is walking hugging his mother and someone asks if they are boyfriend and girlfriend.
His mother says “no, he’s my son” and gives him to the person who asks the question, a construction worker, friend of the family.
We exercise many degrees between attaching and letting go.
He decides to learn how to swim and resumes his master’s thesis which was one of the panic factors at the time when seeking therapy. That is, the self-builder begins to organize the compressing and decompressing of the dense body and the motor coordination job of creeping and crawling.
In our two person journey, as Jorge takes possession of his somatic and existential layers, I theoretically appropriate the kelemanian vision of the constitution of the somatic emotional self in multiple layers of tissues, at different compulsatory rates.
In this phase, the mess and binging come in full force. His notebook on dreams and somagrams is complete garbage: an authentic notebook from the worst student in the class.
Through his empathy with his students, we could work on his despair when facing writing, resuming an interrupted evolution in his learning processes.
His love life after a short relationship with the poor somewhat-prostitute guy and a more cautious tour around the world of saunas, he stabilizes in a relationship with a mechanic who claims to be heterosexual, at the time engaged and later married.
Over the last year and a half, the process of weaving bodies and languages has intensified. The recognition of his methodology with students in the outskirts was allowing him to make his theoretical framework; his dreams led him to identify conflicts with his uncles, also teachers, who imparted to him the professional model but also sexual malaise, along with bitter moralizing about the manifestations of adolescent sexuality towards girls. With his boyfriend, he continues appeasing his neediness, while he starts putting together a sort of sexual friendship, with appropriate distances and mutual help, among two people from such different worlds.
As he continues to build his thesis he lives through conflicts of authority with his advisor and he is terrified over the idea of failure.
He feels the progressive link between his chest and belly with the softening of the diaphragm.
He dreams of his sister’s newborn baby and sees himself fulfulling desires of paternity, in protecting his students, and maternity, in the pregnancy of his thesis, experimenting in his chest feelings of softness and tenderness.
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In the session immediately before the recollection which allowed me to write this text, he showed up saying,
“You know, the relationship with what’s his name has great stuff, he is less macho, he touches me more, he enjoys with me my fantasy of the first guy who fucked me, the story of the “little faggot,” as if he were the older boy who teaches me to use my masculine body. But I have a suspicion because every time he shows up, he always end up asking for some money.” To which I ask: “How much?” He says: “Thirty bucks.” I tell him: “If he was a prostitue you think he would come all the way by bus from the east side to your home if he is as beautiful as you say he is, for only thirty bucks?” To which he responds laughing, for the first time: “I’ve always been ashamed to tell you, but I’m really fucking cheap.”
Finally, with this discovery of the perverse that wants to be the only one who takes advantage, the idea of accepting my invitation to continue his process in group therapy becomes a viable and desirable thing.
Probably, after these four long years of formative stage, we will enter an ending in respect to our dual relationship and Jorge will start another middle ground, this time in a process of socialization with his peers in a group.
REGINA FAVRE
ÁGORA- Institutional Workshop, l995.